sexta-feira, julho 15, 2005
O Escritor Famoso novamente!
"Figura sombria.Alto. Magro. Escanzelado.Bigode farto e tingido pelos fumos.Longas melenas emolduram um rosto que se diria talhado a rudes golpes de enxó.Um cigarro sempre aceso, “imagem de marca”, brinca numas mãos algo etéreas.Caminha sempre exageradamente direito, com um fanático orgulho na erecção da sua coluna vertebral.Calça de ganga. Camiseta vermelha. Polido sapato.Olha, sempre, com um olhar distante e repleto de amargura.O jornal e o maço de papéis. Sempre.O lê-los, relê-los e anotá-los é tarefa sempre incompleta que repete, incessante e insana, todos os dias, sentado à mesa do café.Embora raramente, faz publicar no jornal da terra as suas notas. Os seus poemas.Pobre louco. Diz que é Escritor."
in "O Souselense"


"Ela abordou o escritor famoso, segura nos gestos, na postura, na voz.
- Vim aqui com o propósito de lhe pedir o favor de ler este original de que sou autora. A sua opinião é importante. Talvez decisiva.
O escritor famoso estendeu a mão para segurar o original, enquanto lhe perguntou pelo nome.
- Maria Helena.
- Pois até o leio, Maria Helena, se me disser porque escreve. Sorriu.
- Bem…porque gosto de escrever!
- Não é suficiente. Hoje, toda a gente gosta de escrever!Quase aposto que tem um blog…Tem? - Não. Não tenho, mas escrevo num.
- É a mesma coisa. Pertence ao grupo banal e eclético daqueles para quem não é suficiente dizer. Pois claro que se acabaram as tertúlias de café. Hoje já ninguém conversa, a oralidade está a perder-se. Toda a gente quer fixar as palavras no papel ou no ecrã. No silêncio de um suporte qualquer. A palavra de honra extingue-se. A palavra dita está rouca. A vulgaridade escreve-se. Deve achar que o que tem para dizer é tão importante que tem de o fixar, gravar em caracteres, se possível impressos. Já ninguém conta. Já ninguém diz. Ambiciona escrever um livro…
- Lê ou não lê o original?
- Dá-lhe prazer escrever?
- Sim, claro!
- Nada é claro para quem escreve, minha senhora! Provavelmente tem aqui um depósito de coisas claras que vão ofuscar o leitor....
-E o senhor começou ou não a escrever livros?
-Tenho, como sabe, dezenas e dezenas de livros publicados, tiragens fenomenais. Faço sessões de autógrafos. Pedem-me para ler originais. No entanto, não tenho um blog, nem escrevo para nenhum…
- Dê cá o original! Nunca imaginei que…
- Não! Desculpe… Agora vou ler o seu original. Pediu-me que o lesse. Ou acha que numa conversa me dizia tudo o que tem aqui escrito?"


Maria Heli, de Amor e Ócio


Poderão continuar a acompanhar a viagem deste escritor famoso aqui.
posted by George Cassiel @ 10:15 da manhã  
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"Este era un cuco que traballou durante trinta anos nun reloxo. Cando lle chegou a hora da xubilación, o cuco regresou ao bosque de onde partira. Farto de cantar as horas, as medias e os cuartos, no bosque unicamente cantaba unha vez ao ano: a primavera en punto." Carlos López, Minimaladas (Premio Merlín 2007)

«Dedico estas histórias aos camponeses que não abandonaram a terra, para encher os nossos olhos de flores na primavera» Tonino Guerra, Livro das Igrejas Abandonadas

 
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