quinta-feira, maio 13, 2004
Explosão de intimidade
percorro com o olhar as sombras que trepam as ruínas ao fim da tarde.
um silêncio que absorve o infinito.
e este desejo – maior que os normais desejos –
revela a contradição entre o imaginário solto, livre
e a realidade que nos prende.
o tempo todo emerge bruscamente no lodo.
e surge a vontade de pegar fogo à pintura, à segunda forma de ser
e do ser
e do parecer.

e este desejo que se reflecte no lago verde e projecta a sua sombra imensa
sobre as ruínas do tempo
do ser.
o desejo das ideias reais, que rasgo obstinadamente no final
de cada apresentação.
como o sangue que me invade os pulmões, em nome da ética e da razão.

- uma explosão de intimidade como num cemitério das palavras.
elaboro o requiem por um povo iluminado pela misteriosa luz do tempo,
mas que se deixou esconder no negro finito das sombras
do desejo.
é dessa segunda forma de ser – negra – escondida, de que falo.
do ser e do parecer.
duma contradição entre a imagem - fotografia profundíssima do conhecimento;
e o real, - matéria imperceptível da eterna revelação.

esmago todos os pareceres contra a verdade dos seres,
como quem combate o próprio destino.
uma missão interminável, animada por uma força obscura,
por um desejo maior que revela a contradição.

disponho do vento e das mãos para percorrer com o olhar as ruínas do tempo,
num gesto decidido de inquietação, de quem está vivo.
disponho do céu azul e das aves em voos rasantes sobre o desejo.
disponho do tempo e da distância para ser eu numa segunda forma de ser.
e adormecer descansado.

e acordar no outro dia, depois de percorrer manhãs eternas
numa ânsia incontrolável, numa paixão descartável.
acordar e depois sonhar com as ruínas do passado, inerte,
imóvel sob os escombros.
uma luta incessante com a força das palavras.

e com as mãos modelar o destino em pequenas peças de barro,
para aquecê-las ao sol quente de inverno.

e com o olhar trepar o desejo, que me persegue como o passado.
posted by George Cassiel @ 4:52 da tarde  
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"Este era un cuco que traballou durante trinta anos nun reloxo. Cando lle chegou a hora da xubilación, o cuco regresou ao bosque de onde partira. Farto de cantar as horas, as medias e os cuartos, no bosque unicamente cantaba unha vez ao ano: a primavera en punto." Carlos López, Minimaladas (Premio Merlín 2007)

«Dedico estas histórias aos camponeses que não abandonaram a terra, para encher os nossos olhos de flores na primavera» Tonino Guerra, Livro das Igrejas Abandonadas

 
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